Actualité des Ksours et des igudars (villages fortifiés et greniers collectifs).
As arquiteturas africanas e, particularmente, as do Norte de África que nos são mais familiares, provêm de sociedades não cristalizadas no tempo, surpreendentemente únicas, caracterizadas por processos fecundos de adaptação a meios hostis. As comunidades sedentárias encontram-se, assim, lado a lado com as comunidades nómadas; as sociedades de semi-transumantes desenvolvem vários habitats fixos, estabelecem celeiros comunitários de modo significativo, concebem cidadelas de múltiplas formas; noutros casos modificam alguns assentamentos provenientes de pequenas habitações fortificadas ou, mais pontualmente, de habitações senhoriais monumentais. O que unia estas diversas configurações societais era a sua capacidade para, através do passado, encontrar novas soluções para as mudanças com que eram confrontadas. Mas atualmente, já não o conseguiriam. Atualmente, já não se ajustariam culturalmente.
A arquitetura dos oásis está a desaparecer. Herdeira de uma civilização de jardineiros-agricultores que desenvolveram pequenas cidades, ligadas umas às outras em rosário ou verdadeiras vilas fortificadas muitas vezes erigidas sobre antigos percursos de caravanas, a sua arquitetura encontra-se já há muitas décadas em agonia e, em Marrocos, parece estar mesmo atualmente condenada. As práticas espaciais são desqualificadas por modelos vindos de outros lugares. No entanto, e este será o tema da nossa comunicação suportada por imagens de sítios menos conhecidos, elas reatualizam-se, persistem aqui e ali, resistem.
Pelo menos, enquanto se conservam os lugares onde perduram estas práticas, ditas imateriais. Porque a partir do momento que o edifício se encontra arruinado, e é necessário reconstruí-lo, só raramente os modelos antigos são retomados: as práticas mais complexas ou a gestão dos espaços resultante de uma modificação antropológica de longa duração foram, entretanto, deslegitimadas.
A primeira parte da nossa apresentação incidirá sobre as técnicas de construção (através de casos concretos de restauração / reabilitação), considerando simultaneamente a dimensão antropológica fundamental para compreender todas as componentes da arquitetura vernacular. A segunda parte reincidirá sobre a significação dos espaços enquanto indutora de práticas específicas. A questão converter-se, cada vez mais, na preciosa e frágil “competência de edificar” (F. Choay).
Nota biográfica
Arquiteta diplomada pela École d’Architecture de Paris-La-Villette, Salima Naji exerce a sua atividade profissional como arquiteta, explorando os processos de construção ancestrais, que aperfeiçoa e reconverte a usos contemporâneos, privilegiando o gesto do artesão.
Doutorada em Antropologia Social (Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales, Paris), com certificação pelo Laboratoire de Troisième cycle Arts, Esthétiques Sciences et Technologies de l’Image (Paris VIII), Salima Naji é autora de vários livros de referência sobre arquitetura vernacular do sul de Marrocos. Recebeu diversos prémios em resultado do seu compromisso com a salvaguarda do património construído secular (Prémio Jovens Arquitetos da Fundação EDF, 2004; Prémio Holcim para o Desenvolvimento Sustentável “Bronze Afrique-Moyen-Orient” de 2011; Short list do Prémio Aga Khan de Arquitetura pelo conjunto de sua obra no sul de Marrocos em 2013, ...). O seu trabalho teve origem na investigação-ação para a reabilitação dos celeiros comunitários; esta abordagem participativa foi posteriormente retomada nos Ksours (aldeias fortificadas) do Anti-Atlas e em seguida na vila de Tiznit (do plano de salvaguarda da medina à valorização do património construído, passando atualmente pela criação de instituições culturais).