COSTA, Miguel Reimão - Casas e montes da serra entre as estremas do Alentejo e do Algarve: forma, processo e escala no estudo da arquitetura vernacular. Porto: Afrontamento, 2014. 495 p. ISBN 978-972-36-1383-4.
Na maior parte dos montes, desde o Baixo Guadiana à Vertente Ocidental, os seus habitantes justificam reiteradamente a génese destes vãos entaipados ao conturbado período da guerra civil de Oitocentos, quando a Serra serviu de retiro e quartel às guerrilhas miguelistas que, segundo contam, acometiam; uma e outra vez, contra as populações destes lugares. Estes conjuntos de maiores dimensões aparecem assim associados à ideia de uma organização quase labiríntica de percursos longitudinais e de ligação entre as várias habitações que, em caso de perigo, ofereciam uma rede de trajetos alternativos de fuga para os barrancos próximos onde, como descrevem, se acantonaram então muitas vezes os seus antepassados. Independentemente da veracidade desta narrativa que, como dissemos, se repete em inúmeros e distantes lugares da Serra, ela acaba por traduzir, em cada um destes testemunhos, a ideia de uma grande casa comum. Ainda que apareça associada a circunstâncias históricas muito adversas, esta ideia de grande casa comum constitui uma alegoria do monte entendido enquanto habitação de uma grande família alargada (no sentido genérico do termo), ou pelo menos, como conjunto edificado inerente a uma comunidade marcada por intricadas relações de parentesco, permitindo-nos compreender, de uma outra forma, a organização característica destes assentamentos no período moderno, desde a escala dos conjuntos edificados até à escala do espaço maior do rossio.